Revista Philomatica

terça-feira, 17 de julho de 2018

Gritos patrióticos


Panis et circenses! Beatitudo est communis! Assim terminei minha crônica da semana passada. Como estamos a pleno vapor na Copa do Mundo, um dos parâmetros que uso para medir a alegria e a satisfação popular são os gritos histéricos que ouço durante os jogos. Não condeno o futebol, mas também não é algo com o qual perco meu tempo. Sim, leitor, a vida escorre pelos vãos dos dedos e 90 minutos, duas, três vezes por semana, ao final, enferrujam o espírito, entorpecem o cérebro, atrapalham as sinapses.
Hoje, enquanto leio Roth, ouço gritos histéricos de senhoras e marmanjos. Mais cedo, senti-me um estranho em meu país, uma vez que vestia cinza; escolha involuntária, pois nem mesmo me lembrara da canalha, cujas quadrilhas orquestram-se em todos os poderes e esferas da República. Há um trio no STF que é imbatível! Exportamos tanta coisa: os dribles, as jogadas capciosas, a alegria, o samba! Não demora e exportaremos uma máfia diferente, legalista, amparada na constituição e no cabedal de leis que, agregado a ela, só vale para o povo miserável que, vestido de verde e amarelo, se embriaga com jogadas milionárias e grita satisfeito com as migalhas que caem da mesa da canalha e seus asseclas. Estes, por sua vez, povoam e sugam as tetas da República - de hospitais a universidades. 
Não que o povo não mereça algum circo, vá lá, ninguém é de ferro! Também, convenhamos, não é necessária tanta amofinação e agastamento no dia a dia! Contudo, nos tempos em que vivemos, a despeito de tanta informação que jorra da internet e da tão propalada democratização do conhecimento, o que se vê é a inteligência perdendo de 7 a 1. Quando digo isto, refiro-me sempre aos textos que leio, na maioria das vezes, territórios inóspitos a qualquer raciocínio. Por outro lado, há times cujo objetivo é provar que democratizar o saber é relativizá-lo, donde infiro certa arrogância dessa gente, já que isto pressupõe alguma ascendência sobre o outro.
Assim, grupos de pesquisa constituem-se para estudar, por exemplo - exemplinho bobo este, o caldo é muiiito mais grosso -, o preconceito linguístico na universidade, onde os ‘pobrema’ são expostos, cada um apresenta seu relato vitimista e todos se irmanam na tentativa de tornar o amanhã melhor na universidade, lugar em que supostamente as pessoas frequentariam justamente no intuito de adquirir um saber variegado e que, por isso, só por isso, enfrentariam desafios para irem além daquilo que já dominam. Hoje, não só a carne é fraca, como os espíritos, sobretudo, perderam a rigidez!
Não por outra razão, caso, você leitor, ainda acredite no clichê de que nas universidades só encontrará pessoas cultas, engano o seu! Claro, há exceções, mas em geral é isto. As faculdades de letras, por exemplo, tem-se tornado espaços áridos e inóspitos para a literatura. Creia-me. A narrativa, a fábula, a ficção, têm sido vilipendias e vergastadas por todos os lados. A erotização do corpo, os preconceitos, os rótulos e seus estudos, a configuração geográfica da produção literária, tudo isso e muito mais tem sido o parâmetro para a negação de determinadas obras e autores, a eleição de obras pretensamente literárias e a produção de estudos também pretensamente críticos.
Vá lá, em tempos em que o livro e a leitura têm-se tornado algo abjeto, como redimir e/ou manter espíritos embotados? Não sabe? A canalha sabe, ainda que boa parte dela não tenha lido sequer um soneto, a sabedoria trapaceira tem sido digna de títulos honoris causa. Mas, só a canalha? Evidente que não. Como disse uma senhora expertise da causa, a corrupção é uma velha senhora, por isso é muito conveniente um povo vestindo cores fortes, feliz, risonho e cordial, amante do populismo, inebriado com suas vitórias futebolísticas efêmeras e a dar mostras de que a sobremesa é deliciosa. Enquanto isso... a canalha janta o copioso prato principal. Panis et circenses! Beatitudo est communis! Hurra!!!

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