O
texto de hoje é curto, como é curto o tempo, a vida. Em busca do carro das
ideias, corro os olhos pelas notícias diárias e, para manter alguma sanidade
mental, decido não ler nada! Volto-me à literatura, consolo-me com Carpeaux,
que há muito afirmou ser o poema ainda uma das melhores formas de avaliar a
imbecilidade humana, profunda como o mar.
Contudo,
leitor, se quiser mergulhar nos gouffres amers
da mediocridade, leia, por exemplo, o portal trois étoiles do jornal a serviço do Brasil. Mas a culpa não é
dele, outros também reproduzem as mesmas asneiras, haja vista a política ter
gerado a maior parte dos disparates publicados quotidianamente. Sim, culpa dos
políticos, cuja maioria destaca-se pela mediocridade, a imbecilidade e o
idiotismo de seus pronunciamentos – e de suas próprias existências. Todos, sem
exceção, encastelados nas torres do poder, ignoram os desejos da população. E
não é que hoje Maia resolveu ser porta-bandeira?
Por
outro lado, apresso-me entre os tempos longos e breves, uma vez que o presente
não tem nenhum espaço, mas, ainda assim surpreendo-me com as novas estratégias
do MEC, cuja segunda representante defende um ensino baseado na palavra de
Deus. Iolene Lima, afirmou que o “primeiro
matemático e geógrafo foi Deus" e que "as crianças começam a ter
contato com essas matérias no primeiro livro da Bíblia, o Gênesis”. Ela também defendeu organizar o currículo
escolar “a partir das escrituras”.
E,
como o governo acaba de criar uma comissão para o aparelhamento da prova do
Enem e, ontem no Rio, o ministro-chefe da casa civil do governo pediu o fim da
manipulação ideológica nas universidades, resolvi dar uns pitacos:
1.
a Iolene Lima: redija problemas matemáticos aos alunos bem à la Gêneses, elabore-os tendo em mente as pragas que consumiram os
egípcios, algo como: quantos gafanhotos de Maia seriam necessários para
destruir a plantação do funcionário do Bolsonaro, considerando que a metragem
determinada de sua plantação fora baseada em projetos criados a partir de
hipóteses geradas por um sistema copia e cola?
Sugiro
ainda que Iolene promova reuniões interministeriais e teste os alunos deste
modo: considerando-se que uma goiabeira possui 130 galhos, cada galho 19
goiabas, quantas goiabas tem a goiabeira? Cristo, materializando-se sobre essa
mesma goiabeira, quantas goiabas comeria a cada 10 minutos? Quanto tempo
levaria ele para comer todas a goiabas levando-se em conta que cada fruta pesa
em torno de 100 gramas?
2.
ao eminente ministro, aconselho que leia Adorno; é claro, não peço que leia
seus textos mais elaboradores e difíceis, não quero que tenha lá uma enxaqueca,
um surto de realidade. Basta que leia “Palestra sobre lírica e sociedade”. Caso
não o encontre nas bibliotecas do palácio, aí vai um lampejo da inteligência do
filósofo: “Recomenda-se vigilância, sobretudo, perante o conceito de ideologia,
hoje debulhado até o limite do suportável. Pois ideologia é inverdade, falsa
consciência, mentira.”
Por
fim, na teocracia tupiniquim, face à reiterada afirmação de que só Cristo
salva, resolvi fazer dela a questão do dia, carregada de alguma dúvida: “Só
Cristo salva?” Imediatamente vieram-me ao espírito Machado de Assis, Guimarães,
Manuel Bandeira, Drummond, Proust, Voltaire... e toda uma miríade de poetas,
escritores, anjos e demônios. Certo de que vivo um momento de mens sana in corpore sano, respondo:
“Não, mas Literatura sim!”
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