Revista Philomatica

quarta-feira, 3 de abril de 2019

Só Cristo salva? Não, mas a Literatura sim!


O texto de hoje é curto, como é curto o tempo, a vida. Em busca do carro das ideias, corro os olhos pelas notícias diárias e, para manter alguma sanidade mental, decido não ler nada! Volto-me à literatura, consolo-me com Carpeaux, que há muito afirmou ser o poema ainda uma das melhores formas de avaliar a imbecilidade humana, profunda como o mar.
Contudo, leitor, se quiser mergulhar nos gouffres amers da mediocridade, leia, por exemplo, o portal trois étoiles do jornal a serviço do Brasil. Mas a culpa não é dele, outros também reproduzem as mesmas asneiras, haja vista a política ter gerado a maior parte dos disparates publicados quotidianamente. Sim, culpa dos políticos, cuja maioria destaca-se pela mediocridade, a imbecilidade e o idiotismo de seus pronunciamentos – e de suas próprias existências. Todos, sem exceção, encastelados nas torres do poder, ignoram os desejos da população. E não é que hoje Maia resolveu ser porta-bandeira?
Por outro lado, apresso-me entre os tempos longos e breves, uma vez que o presente não tem nenhum espaço, mas, ainda assim surpreendo-me com as novas estratégias do MEC, cuja segunda representante defende um ensino baseado na palavra de Deus. Iolene Lima, afirmou que o “primeiro matemático e geógrafo foi Deus" e que "as crianças começam a ter contato com essas matérias no primeiro livro da Bíblia, o Gênesis”. Ela também defendeu organizar o currículo escolar “a partir das escrituras”.  
E, como o governo acaba de criar uma comissão para o aparelhamento da prova do Enem e, ontem no Rio, o ministro-chefe da casa civil do governo pediu o fim da manipulação ideológica nas universidades, resolvi dar uns pitacos:
1. a Iolene Lima: redija problemas matemáticos aos alunos bem à la Gêneses, elabore-os tendo em mente as pragas que consumiram os egípcios, algo como: quantos gafanhotos de Maia seriam necessários para destruir a plantação do funcionário do Bolsonaro, considerando que a metragem determinada de sua plantação fora baseada em projetos criados a partir de hipóteses geradas por um sistema copia e cola?
Sugiro ainda que Iolene promova reuniões interministeriais e teste os alunos deste modo: considerando-se que uma goiabeira possui 130 galhos, cada galho 19 goiabas, quantas goiabas tem a goiabeira? Cristo, materializando-se sobre essa mesma goiabeira, quantas goiabas comeria a cada 10 minutos? Quanto tempo levaria ele para comer todas a goiabas levando-se em conta que cada fruta pesa em torno de 100 gramas?
2. ao eminente ministro, aconselho que leia Adorno; é claro, não peço que leia seus textos mais elaboradores e difíceis, não quero que tenha lá uma enxaqueca, um surto de realidade. Basta que leia “Palestra sobre lírica e sociedade”. Caso não o encontre nas bibliotecas do palácio, aí vai um lampejo da inteligência do filósofo: “Recomenda-se vigilância, sobretudo, perante o conceito de ideologia, hoje debulhado até o limite do suportável. Pois ideologia é inverdade, falsa consciência, mentira.”
Por fim, na teocracia tupiniquim, face à reiterada afirmação de que só Cristo salva, resolvi fazer dela a questão do dia, carregada de alguma dúvida: “Só Cristo salva?” Imediatamente vieram-me ao espírito Machado de Assis, Guimarães, Manuel Bandeira, Drummond, Proust, Voltaire... e toda uma miríade de poetas, escritores, anjos e demônios. Certo de que vivo um momento de mens sana in corpore sano, respondo: “Não, mas Literatura sim!”

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