Revista Philomatica

terça-feira, 12 de abril de 2011

Ronaldinho Gaúcho na ABL: que merda é essa?

Não! É o apocalipse! Confesso: não pude esperar e tenho que dar meus pitacos. Ontem – acreditem - Ronaldinho Gaúcho recebeu da Academia Brasileira de Letras (ABL) a mais alta honraria da casa, a medalha Machado de Assis, que a Academia, num oportunismo atroz, vangloriou-se por tê-la entregue, pela primeira vez, a um jogador de futebol.
Logo que ouvi a notícia – surpreso - tive frêmitos: temi por Machado. Em que posição ficaria agora, depois de ter se remexido no túmulo? E mais: incomodou-me o forte zumbido que teimava soar em meus ouvidos: o que tem a ver alhos com bugalhos - aqui, na versão nada preconceituosa e provavelmente mais próxima do jogador: o que tem a ver o c... com as calças?... Claro, hoje corri para ver o que se publicou a respeito.
Soube que entre imortais da Academia, sempre pomposos, o jogador, de camisa semi desabotoada exibia seus grossos cordões de ouro, encimados pela boina preta que não retirou da cabeça, certamente uma forma delicada de sugerir aos anfitriões a modernização dos antigos, clássicos, pesados e nada confortáveis fardões, por eles adotados. Mas o que estaria ele fazendo em campo tão diverso do seu, ao lado de uma entourage que incluía a cúpula do Flamengo?
Ora, a Academia, ciosa em manter-se nas colunas dos jornais, tal qual as celebridades BBBs, lembrou-se de que um de seus membros um dia fora torcedor flamenguista. Exumaram José Lins do Rego e, de quebra, envolveram Machado no imbróglio.
Os 110 anos do nascimento do escritor paraibano dispensaram colóquios de estudiosos, contudo, receberam sinceras homenagens que, nas palavras da ilustre presidente do Flamengo, a Sra. Patrícia Amorim, enalteceram a figura do escritor. Segundo ela, com seus “romances e poemas”, Lins do Rego conseguia transmitir a alegria de ser rubro-negro. Dizem que a filha do escritor, Maria Cristina, diplomática, ao saber da novidade, deixou escapar que seu pai jamais escrevera poemas. Mas isto não é nada: o que interessa é que Marcos Vilaça, presidente da ABL, esteve exultante e, de mais a mais, as dúvidas deverão ser dirimidas pela Sra. Amorim, conhecedora de Lins do Rego. Penso que toda a homenagem veio porque o autor de obras como Fogo Morto e Menino de Engenho, morto em 1957, entre os anos de 1942 e 1954, foi secretário-geral da Confederação Brasileira de Desportos (CBD), atual CBF.
Talvez o mais lúcido durante o galanteio tenha sido o próprio jogador que, ao ser inquirido sobre qual era seu livro preferido, reconheceu que o mundo literário não é sua praia. Enfim, fez aquilo que sabe, driblou a imprensa e respondeu: “Não tenho livro preferido, não é muito a minha, mas adorei a homenagem e vou pegar umas dicas com o pessoal daqui.” E acrescentou: “Cultura nunca é demais.”, dicas, aliás, logo atendidas, pois Vilaça presenteou o jogador com um livro de Lins do Rego.
Vilaça prosseguiu: “Queria aproveitar este momento para fazer a iniciação literária do Ronaldinho com Flamengo é Puro Amor, de José Lins do Rego, que era apaixonado pelo clube.” Flamengo é Puro Amor é uma coletânea de 111 contos e crônicas do autor, todas sobre futebol. No livro, Lins do Rego revela os bastidores dos clubes e seus dirigentes - especialmente do Flamengo - seu clube do coração, além de contar histórias sobre alguns ídolos de sua época como Heleno de Freitas, Ademir, Jair da Rosa Pinto e Zizinho.
Até aí, tudo bem, ótimo, maravilha: mas tinham que meter Machado no meio?


Imagem: disponível no Google Images. Caricatura de Baptistão.

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