
Esses
leitores comentaristas e críticos maturavam suas ideias ao escrever, qual seja,
supõem-se que liam os textos, senão demoradamente, mas em sua integralidade, antes
de se comunicarem com os jornais. A interlocução era mais demorada, o que,
acredito, impunha certo filtro aos comentários. Havia opiniões que extrapolavam
a simples manifestação da concordância e ou discordância da matéria, estendiam
a discussão proposta provocando uma interação que acabava por abarcar um grupo amplo
de leitores e, com isso, criava-se um diálogo em que o objeto em questão era
analisado em seus diferentes aspectos. Isso, em muitas das vezes, destituía a
parcialidade primeira imposta à matéria.
Hoje,
contudo, com a agilidade impressa aos meios de comunicação, sobretudo sites de notícias que permitem a opinião
instantânea do leitor, algo mudou. Há certa impaciência na leitura de textos um
pouco longos. Quando digo ‘um pouco longos’ refiro-me a textos que dobram ou
triplicam a quantidade de caracteres imposta pelo Twitter, por exemplo. Nesse novo formato não se tem mais tempo para
pensar sobre o que se está lendo e o resultado disso tudo é um circo de
horrores que se materializa nos comentários.
A
opinião dos leitores é rasteira, superficial e, não bastasse isso, vem
acrescida de uma enormidade de erros gramaticais. É certo que os adeptos da
Escola do Ressentimento defendem a ideia do preconceito linguístico, mas não
estou falando disso, até mesmo porque, dependendo do viés, isto pode ser
desmontado como um castelo de cartas. Em tempo: considero a existência do preconceito
linguístico, mas é incompreensível que alunos saiam de curso universitário
escrevendo como escrevem nos comentários que deixam ao final das matérias em sites de notícia. É lamentável! Mesmo o
ensino superior (falo dos departamentos de letras, os outros, só Deus na
causa!) passou a só instrumentalizar: lê-se para ler manuais, bulas e
informativos. Se não generalizo é porque justaponho ao lado da redundante
“grande maioria”, uma minoria perdida quase extraterrestre.
Ginecomastia,
fotofobia, dor abdominal superior, constipação, boca seca, disgeusia, dispepsia,
astenia, calafrios, fadiga, fogacho, mal-estar, pirexia icterícia, reação anafilactóide,
hiperlipidemia, aumento do apetite, mialgia, tontura, parestesia, calor,
formigamento, sonolência, insônia, nervosismo, epistaxe, eritema multiforme,
prurido, erupção cutânea, urticária, xeroderma, hipotensão ortostática etc, são
alguns dos sintomas que o leitor ou alunos sentem face a um texto que demanda
algum tempo e alguma reflexão.
Nesses
tempos de intensa cultura massa e pasteurização do conhecimento, em que
clássicos são reduzidos a extratos e textos de duas colunas dão conta de assuntos
complexos, que não pedem mais que dois minutos de leitura, é impossível não se
lembrar de Fahrenheit 451, de Ray
Bradbury e citá-lo de memória sem aspas nem nada!
Os
alunos saídos hoje da universidade, tornam-se leitores preparados para a
leitura instrumentalizada de manuais, bulas e informativos, porém, ao sair,
acreditem, mostram-se pouco íntimos de livros que têm textura e poros. Os poros,
para Bradbury, significam qualidade e qualidade muitas vezes traduz-se por clássicos. Para quem não sabe, nos
departamentos de letras há a tchurma especializada
em refutar os clássicos. Ocorre que esta espécie de livro têm feições, diz
Bradbury, e as feições nem sempre agradam à massa bovina e frívola que
quotidianamente se movimenta como títeres e cuja preocupação é a expressão, o
elogio ou a crítica que pode ferir o outro, não pela intenção, maldade,
exploração ou preconceito, mas porque o discurso montado pela Escola do
Ressentimento assim o quer. E voilà,
continuamos todos bem informados, mas pensamos pouco, bem pouco. Afinal, a
ignorância é tranquilizadora e traz a felicidade que todos procuramos.