E 2017 enfiou o pé a fundo no acelerador! Findou-se mais uma daquelas semanas
pobres, em que os assuntos não oferecem muita relevância, sobretudo porque
a canaille política, recolhida em seus covis - ou em Paris -,
adia os habituais escândalos para fevereiro ou março, meses em que
pretensamente volta ao trabalho.
O resultado é que a maioria dos sites de notícias, num
esforço hercúleo para atrair o leitor, anda recheada de disparates. Quase nada
se aproveita; o risco, nesses casos, é de embotar as ideias. Pensando
informar-se, o leitor escorrega ladeira abaixo e é levado a comprar ouro de
tolo.
À procura da arraia-miúda, satisfiz-me com o fútil. No site do
partido, o episódio mais lido pelos leitores foi a gafe cometida ao
vivo por uma jornalista - mais isso foi lá em 2006! Afora mexericos e otras
cositas más, o tempo só esteve para rebeliões, de modo que a
marginália continuou sob os holofotes.
Procuro daqui, procuro dali, e acabo na orla de Fortaleza em meio a uma
multidão que, aos gritos, incentivava um casal que se conhecia biblicamente,
esquecendo abertas as cortinas do quarto do hotel. O desempenho mereceu
registros que, publicados na rede, foram vistos por milhares de voyeurs.
Avesso a adjetivos, continuei minha busca até dar com os olhos em uma
notícia que vinha de Belo Horizonte. Tratava-se de um pedido protocolado por
alguns historiadores no Iepha (Instituto
Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais); nele, solicitam
a exclusão dos nomes de três ‘falsos inconfidentes’ do Monumento à
Terra Mineira, inaugurado em 1930 em homenagem a bandeirantes paulistas e
inconfidentes.
Lido o tal artigo, bateu-me a dúvida: como não
acreditar piamente nas aulas de Dona Benedita, jurando de pés juntos que a
conspiração havia sido desmantelada em 1789? Para o menino atento às aulas, só
essa data já o enchia de admiração e respeito pelo levante de Vila Rica. Por
sua vez, o artigo afirma que o movimento contra a Coroa Portuguesa deu-se em
1792!
- Dona Benedita? Então foi no mesmo ano da
Revolução Francesa?!
- Isso mesmo! Mas, atenção meninos, só em 17 de
abril de 1792 é que foi lida a sentença na cidade do Rio de Janeiro. Doze dos
Inconfidentes foram condenados à morte! Mas, no dia seguinte, leu-se um decreto
de D. Maria I, pelo qual todos, exceto Tiradentes, tiveram a pena comutada.
Tiradentes, nosso herói! Dona Benedita enchia o peito e pronunciava um herói pleno
e aspirado.
A despeito dos três intrusos (o escravo Alexandre,
Fernando José Ribeiro e José Martins Borges) que os historiadores afirmam não
terem participado do levante, cá com os meu botões, pensei na repaginação
sofrida pelo herói de Dona Benedita, empreitada levada a cabo pelos ideólogos
positivistas na fundação da República.
Ao buscar em Tiradentes a personificação da
República, o militar que tinha no máximo um bigode e que, na prisão, fora
obrigado a raspar barba e cabelo par evitar piolhos, à beira do cadafalso, teve
sua figura assemelhada a Jesus Cristo, ganhou camisolão e barba feito
madeixa.
Ah, há ainda as teorias conspiratórias! Mas o
melhor a fazer é deixá-las de lado; porém, não deixa de ser instigante o relato
do carioca Marcos Correa que, na Paris de 1969, ao pesquisar a vida de José
Bonifácio de Andrade e Silva, encontrou a assinatura de um tal de Antônio
Xavier da Silva, na lista de presença da Assembleia Nacional Francesa, bem ao
lado da do Patriarca da Independência. Aí começam as suspeitas de um complô
orquestrado pelos maçons em que há a similaridade de assinaturas, a troca de
Tiradentes por um ladrão, sua fuga para a Europa... Os militares, no século XX,
teriam se encarregado de apagar rastros e colocá-lo no panteão dos heróis
nacionais.
De minha parte, procuro guardar o dito do mestre,
cuja opinião era de que a lenda é melhor do que a história autêntica, razão
pela qual não desacredito da ficção. A história de Tiradentes é mais um desses
exemplos em que a ‘verdade’ das realidades usurpa a lenda metida nos livros.
Para isso basta sair em busca do relato de Marcos Correa, bisbilhotar arquivos
de bibliotecas e museus... quiçá não tenham sido destruídos. O fato
é que, para acomodar interesses, a história pode ser modificada pela ficção.
Por isso mesmo Machado afirma ser possível inventar “um pássaro sem asas,
descrevê-lo, fazê-lo ver a todos” e, ao fazê-lo, levar todos a acreditar “que
não há pássaros com asas”.
Por fim, surpreendi-me mesmo foi com a notícia de
que cientistas chegaram à conclusão de que as galinhas são mais inteligentes do
que pensamos: são capazes de empatia, lógica e até alguma astúcia. Enfim, algum
alento para a humanidade...
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